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segunda-feira, 29 de junho de 2015

"Enfim sós – tu, ele, eu, eles e nós: a arte do encontro" por Luciane Olendzki

Embora haja tantos desencontros pela vida, como diz o poeta Vinicius de Moraes: a vida é a arte do encontro! Saravá, a benção poeta!

Era uma vez uma história de amor. Tudo começou não se sabe exatamente quando. Talvez em 1997, quando duas jovens atrizes se encontraram e se conheceram trabalhando no mesmo grupo de teatro por quatro anos. E assim, se tornaram grandes amigas. O grupo de teatro, do qual elas faziam parte, terminou. Tudo tem um fim. Essas amigas continuaram sendo amigas, e compartilharam muitos outros fins que passaram por suas vidas. Por caminhos distintos, cada uma a seu modo e tempo, descobriam que amavam a arte do palhaço e que queriam ser palhaças. Elas não trabalhavam mais juntas. No entanto, faziam e gostavam de fazer coisas afins, especialmente como palhaças. Viajaram para países diferentes, em tempos diferentes, para aventurarem-se e aprenderem sobre a encantadora arte do palhaço. E por um longo tempo, não se viram mais. Até que finalmente, em 2005, elas voltam a trabalhar juntas. Uma pequena nau de papel boiando ao léu, com palhaços tentando salvar-se de um naufrágio, perdidos na imensidão de um oceano inexistente – ou mar de possibilidades. Esta era a situação principal do espetáculo – A Partida. Elas estavam juntas nessa nau, Luciane como uma das palhaças da trupe e Melissa como diretora do espetáculo. Depois disso, iniciaram outras partidas e apostas, não trabalharam mais juntas e continuavam amigas.

Ou melhor, essa história de amor começou em 2013. Quando Luciane, em passagem por sua cidade natal, ministrou uma oficina de construção de números clownescos, tendo como ilustre participante: a colega e amiga Melissa. Durante os sete dias mais frios de julho ou da história de Porto Alegre, como diziam os meteorologistas, elas estavam trabalhando juntas, com outras pessoas, com funções e relações nunca dantes experimentadas entre elas. Melissa apresentava com sua palhaça, a Roliça, um número com um terno vestido em um cabide, como se aquilo fosse um homem, pelo qual ela estava apaixonada e com ele queria casar. E tudo dava errado, aquele pretenso homem literalmente se desmontava. Naquele período, Melissa recém havia terminado seu primeiro casamento e Luciane estava prestes a se casar com o primeiro marido pela segunda vez, tendo Melissa como madrinha de casamento. Tudo tem um (re)começo. No meio disso tudo, entra o Fábio em cena.

Fábio também era participante da oficina e, o seu palhaço, o Julieto Justo, foi eleito por Luciane para entrar no número da Roliça, a fim de ajudá-la a recolher e tirar de cena os pedaços do homem ilusório, que não passava de um cabide quebrado e um casaco vazio. Eis que, Julieto Justo e Roliça se encontram! E brincam com tudo aquilo. Foi um grande encontro, para a nossa alegria. No gelado julho de 2013, naquela oficina, Luciane, Melissa e Fábio sequer podiam imaginar onde tudo isso daria algum dia...

Mel e Fábio, oficina de números clownescos, 2013. Foto: Jéssica Lusia 

Jamais poderiam imaginar um novo encontro, como este que estamos vivendo agora, aventurosamente juntos desde fevereiro de 2015. Ou desde 1997, ou desde 2013? Fato é que no final de 2013, Melissa entra no Grupo Trilho de Teatro Popular, grupo prestes a completar atualmente 10 anos, tendo como um de seus artistas, quem? Ora, o Fábio. Saravá, benção poeta!

“Enfim Sós – Uma tragicomédia clownesca", o projeto enviado e aprovado pelo Edital Funarte Caixa Carequinha. Poderia ter sido Roliça na Roça, mas não foi. Poderia ter sido Beckett e os palhaços, mas não foi. Poderia ter sido tragédia grega e palhaços, mas não foi. Poderiam ter sido muitas outras coisas, mas não foi. Pois nem tudo acontece.

Foi um dia, fevereiro de 2014, carnaval, num sofá Melissa falava à Luciane sobre a vontade de montar um espetáculo. Eu disse: bom, que tal chamar, ora, quem? O Fábio. Passado algum tempo, Fábio e Melissa me chamaram, com ideias e projetos a realizar. Algumas coisas acontecem.

Carnaval de 2015, enfim nós, juntos trabalhando, dia e noite, no calor e esplendor dos fevereiros de Barão Geraldo. Por 15 dias ininterruptos, em sala, no mato, em casa, suando, lendo, vendo filme, contracenando com um grupo de gansos na praça, fazendo conexões com o ET Bilu, rindo, chorando, dançando, dormindo, bebendo, comendo, fumando, convivendo com outro grupo de teatro (amados Folgazões) numa casa com nove hóspedes (a minha), dentre eles, o bebê Ravi que nos rendeu uma das boas ideias para o figurino do Julieto Justo... Benção, palhaço, saravá!

Muitas coisas aconteceram neste processo. Dentre elas, quatro imersões de trabalho dos atores-palhaços com a diretora, também com participação da equipe. As imersões são um modo intensivo (e intenso) de encontro, uma vez por mês, com uma carga horária de até 70 horas ou mais de trabalho em 10 dias, ufa. Um procedimento que se deu especialmente pelo fato da diretora residir num estado e a equipe em outro. Embora haja tantos desencontros pela vida... Giovanna Zottis está perto, bem junto, em assistência de direção, também sendo integrante do Grupo Trilho, sorte nossa! E esposa de quem? Ora, do Fábio – sorte dele.

Ensaios, primeira imersão, 2015. Foto Natasha Mota
Nestas imersões provei e comprovei que estava em um encontro com uma equipe maravilhosa, em um trabalho bastante colaborativo, com profissionais afiados e comprometidos em suas funções, participativos e propositivos. Nem toda a equipe faz parte do Grupo Trilho, que conta com artistas convidados para realização deste projeto, como eu na função de direção. No entanto, trabalhamos numa atmosfera e no trilho de um teatro de grupo, com grande cooperação. Eu acredito no teatro de grupo e no teatro do Grupo Trilho. Assim como é impossível amar sozinho, fazer teatro também é impossível sozinho. Assim, eu percebo. Amar e fazer teatro, não se faz só, é com ele, eu, eles e nós. É com Patrícia Preiss e Margarida Rache arrasando no cenário, figurino, apetrechos, um luxo de disponibilidade, prontidão e criatividade. Saravá! É com o Baiano (Sérgio Lemos) com uma eficiência cheia de sensibilidade para a música de cena, artista de escuta, sempre com excelentes respostas musicais, até para os meus wathsapp com pedidos ou questões em horários inapropriados. Saravá! Com o Gabriel Gorski que quando vem, vem que vem e está junto nessa, compondo a trilha com o Baiano. Saravá, bandolim! Com o Bathista Freire que vem pra nos iluminar, nós a dar a luz... Saravá, aos bons reencontros! Com Sílvia Abreu sempre alerta e junto, com entusiasmo profissional, na torcida com seu sorrisão, em uma super assessoria de imprensa. Saravá! Com Bruna Immich, Daniel Gustavo e Carol Falero – integrantes do Grupo Trilho, dando sempre todo apoio, na produção, no espaço, no ensaio aberto, na execução do projeto, nos ensaios internos como plateia crítica e generosa. Saravá, a benção, palhaço!

Enfim, muito vos posso lhe contar, de como mergulhamos e saímos de cada imersão de trabalho. 1001 noites podem ser necessárias. Mas o que nos importa agora é passarmos uma noite contigo, e poder ter um bom encontro! Vem!

Afinal, assim como a vida é arte do encontro, a arte do palhaço também é.

Uma vez eu li num livro de filosofia, de um tal Deleuze, coisas mais ou menos assim: “bons encontros” são aqueles que aumentam nossa potência, nossa capacidade de afetar e ser afetado, de agir e de sentir, em prol da vida e da alegria. Os bons encontros são repletos de paixões alegres. Paixão como uma grande capacidade de receber, de sofrer uma ação, no sentido de ser afetado e com isso também produzir e reverberar novo afeto e re-ação. Pensei, está aí, a arte do palhaço tem a ver com esses tais bons encontros, afetar e ser afetado, padecimentos alegres cheios de potência vitalista... E ainda, tal arte efetiva seu sentido, encontra seu prumo, rumo e potência, no vai-e-vem das trocas com a plateia, nos encontros com o público. Cada apresentação um encontro novo e único, só com vocês – respeitável (e amável) público.

A arte do palhaço é uma forte arte do encontro, de apaixonamento à vida, à alegria, à brincadeira, ao riso, de estar junto. No encontro com o público, muitas coisas podem acontecer! O palhaço nos lembra que podemos muito, inclusive errar, fracassar, se dar mal e dar a volta por cima e seguir adiante, apaixonadamente até. E rir. E chega de nossa vã filosofia. Pois está na hora de partirmos para os bons encontros! Pois queremos te encontrar!

Contigo e com todos os presentes, queremos brincar e começar uma nova história de amor. A cada vez, era uma vez, e aí estaremos: “enfim nós”.

Lar dos Velhinhos/ Campinas, Fevereiro 2015. Foto Natasha Mota

Em “Enfim Sós – Uma tragicomédia clownesca", os palhaços além de viverem suas próprias histórias de amor com muitos quiproquós, fortes emoções, basbaquices, encontros e desencontros, também querem aventurar-se em histórias de amor com o público. Ou melhor, em histórias de amor do público. Alguns dos quadros do espetáculo são improvisos dos palhaços a partir de histórias colhidas da plateia, a cada apresentação.

Então, Julieto e Roliça te esperam de coração aberto para uma nova história de amor. Quem sabe tua história de amor, venha ser a nossa história de amor?

A cada vez, era uma nova vez: nós em “Enfim Sós”. Te esperamos para um boníssimo encontro cheio de alegria. Pois, também, como diz o poeta: a alegria é a melhor coisa que existe, é assim como a luz no coração! E a vida é pra valer! E como querem os palhaços, a vida é brincadeira, na arte do encontro: vem!

A benção, palhaço, saravá!


Enfim Sós – Uma tragicomédia clownesca.

De quinta a domingo, às 20h – de 02 a 19 de julho.

Teatro Bruno Kiefer – 6º andar da Casa de Cultura Mário Quintana

(Rua dos Andradas, 736).

Ingressos: só R$ 10,00.

Nas quintas o ingresso é produtos de limpeza ou gêneros alimentícios que serão doados à Casa do Artista Rio Grandense.

2 comentários:

  1. Respostas
    1. Que história linda. É uma hora para nós ( Folgazões) e um orgulho imenso ter feito parte desta história. Ser lembrado, nossa! Vocês são lindos, queridos e amados. Tenho certeza que “Enfim Sós” é um trabalho encantador, daqueles que tocam a alma. Quero muito ver! Beijo no coração e obrigado mais uma vez pela generosidade com que nos receberam e pelo maravilhoso encontro que nos proporcionaram...
      “Meeeeeeeeeeexe no lixo!!!!!”
      A benção, palhaço, sarava!
      Wyller Villaças , agora palhaço, pai do Ravi, marido da Vanessa que é mãe do Ravi e que também se tornou palhaça.

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